domingo, 5 de maio de 2013

13. PENAS E GOZOS FUTUROS




A Doutrina Espírita, no que respeita às penas futuras, não se baseia numa teoria preconcebida; não é um sistema substituindo outro sistema: em tudo ela se apoia nas observações, e são estas que lhe dão plena autoridade. Ninguém jamais imaginou que as almas, depois da morte, se encontrariam em tais ou quais condições; são elas, essas mesmas almas, partidas da Terra, que nos vêm hoje iniciar nos mistérios da vida futura, descrever-nos sua situação feliz ou desgraçada, as impressões, a transformação pela morte do corpo, completando, em uma palavra, os ensinamentos do Cristo sobre este ponto.

Lemos no Livro dos Espíritos o seguinte:
960. De onde procede a crença, que se encontra em todos os povos, nas penas e recompensas futuras?
- É sempre a mesma coisa: pressentimento da realidade, dado ao homem pelo seu Espírito. Porque ficai sabendo, não é em vão que uma voz interior vos fala e vosso mal está em não escutá-la sempre. Se pensásseis bem nisso com a devida frequência vos tornaríeis melhores.

961. No momento da morte, qual o sentimento que domina a maioria dos homens: a dúvida, o medo ou a esperança?
- A dúvida para os céticos endurecidos; o medo para os culpados e a esperança para os homens de bem.

962. Por que há céticos, desde que a alma traz para o homem o sentimento das coisas espirituais?
- São em menor número do que supondes. Muitos se fazem de espírito forte durante esta vida por orgulho, mas no momento da morte não se conservam tão fanfarrões. A consequência da vida futura se traduz na responsabilidade dos nossos atos. A razão e a justiça nos dizem que, na distribuição da felicidade a que todos os homens aspiram, os bons e os maus não poderiam ser confundidos. Deus não pode querer que uns gozam dos bens sem trabalho e outros só o alcancem com esforço e perseverança. A ideia que Deus nos dá de sua justiça e de sua bondade, pela sabedoria de suas leis, não nos permite crer que o justo e o mau estejam aos seus olhos no mesmo plano, nem duvidar de que não recebam, algum dia, uma recompensa e outro o castigo, pelo bem e pelo mal que tiverem feito. 

1. O NADA E A VIDA FUTURA


O homem tem instintivamente horror ao nada porque o nada não existe, ele possui o sentimento instintivo da vida futura. Antes de encarnar o espírito conhecia todas essas coisas e a alma conserva vaga lembrança do que sabe e do que viu no estado espiritual.
É de todos os tempos a preocupação do homem com o seu futuro para lá do túmulo. Qualquer que seja a importância que o ligue à vida presente, não pode ele furtar-se a considerar quanto essa vida é curta e, sobretudo, precária. Que será dele após o instante fatal? Questão grave esta, porquanto não se trata de alguns anos apenas, mas da eternidade.
"A ideia do nada tem qualquer coisa que repugna à razão. O homem que mais despreocupado seja durante a vida, chegando o momento supremo pergunta a si mesmo o que vai ser dele e, sem o querer, espera."
"Crer em Deus, sem admitir a vida futura, seria um contra senso. O sentimento de uma existência melhor reside no foro íntimo de todos os homens e não é possível que Deus aí o tenha colocado em vão."
"A vida futura implica a conservação da nossa individualidade, após a morte. Com efeito, que nos importaria sobreviver ao corpo, se a nossa essência moral houvesse de perder-se no oceano do infinito? As consequências, para nós, seriam as mesmas que se tivéssemos de desaparecer no nada."

 2. INTUIÇÃO DAS PENAS E GOZOS FUTUROS


A crença com que deparamos entre todos os povos, na existência de penas e recompensas, origina-se do pressentimento da realidade, trazido ao homem pelo espírito nele encarnado. Os sentimentos que dominam os homens no momento da morte são: a dúvida, nos cépticos empedernidos; o terror, nos culpados; a esperança, nos homens de bem.
Uma vez que a alma traz ao homem o sentimento das coisas espirituais, os cépticos "são em número menor do que se julga. Muitos se fazem espíritos fortes, durante a vida, somente por orgulho. No momento da morte, porém, deixam de ser tão fanfarrões." A responsabilidade dos nossos atos é a consequência da realidade da vida futura. Dizem-nos a razão e a justiça que, na partilha da felicidade a que todos aspiram, não podem estar confundidos os bons e os maus. Não é possível que Deus queira que uns gozem, sem trabalho, de bens que outros só alcançam com esforço e perseverança.
"A ideia de que, mediante a sabedoria das suas leis, Deus nos dá da sua justiça e da sua bondade não nos permite acreditar que o justo e o mau estejam na mesma categoria a seus olhos, nem duvidar de que recebam, algum dia, uma recompensa ou um castigo, pelo bem ou pelo mal que tenham feito. Por isso é que o sentimento inato que temos da justiça nos dá a intuição das penas e recompensas futuras."

3. INTERVENÇÃO DE DEUS NAS PENAS E RECOMPENSAS


Deus ocupa-se, pessoalmente, com cada homem? Não é ele muito grande e nós muito pequeninos para que cada indivíduo em particular tenha, aos seus olhos, alguma importância?
Deus ocupa-se com todos os seres que criou, por mais pequeninos que sejam. Nada, para a sua bondade, é destituído de valor. Mas será necessário que Deus atente em cada um dos nossos atos, para nos recompensar ou punir? Esses atos não são, na sua maioria, insignificantes para ele? Deus tem as suas leis a regerem todas as vossas ações. Se as violais, vossa é a culpa. Indubitavelmente, quando um homem comete um excesso qualquer, Deus não profere contra ele um julgamento, dizendo-lhe, por exemplo: Foste guloso, vou punir-te. Ele traçou um limite; as enfermidades e muitas vezes a morte são a consequência dos excessos. Eis aí a punição; é o resultado da infracção da lei. Assim em tudo.
Todas as nossas ações estão submetidas às leis de Deus. Nenhuma há, por mais insignificante que nos pareça, que não possa ser uma violação daquelas leis. Se sofremos as consequências dessa violação, só nos devemos queixar de nós mesmos, que desse modo nos fazemos os causadores da nossa felicidade, ou da nossa infelicidade futura.
Deus é previdente e "nos adverte, a cada instante, de que estamos fazendo bem ou mal. Envia-nos os espíritos para nos inspirarem, porém não os escutamos." E, além disso, faculta sempre ao homem, concedendo-lhe novas existências, recursos para reparar os seus erros passados.

4. NATUREZA DAS PENAS E GOZOS FUTUROS


As penas e gozos da alma após a morte não podem ser materiais, pois a alma não é matéria. Nada têm de carnal as penas e gozos; entretanto, são mil vezes mais vivos do que os que experimentamos na Terra, porque o espírito, uma vez liberto, é mais impressionável, pois a matéria já não lhe reduz as sensações.
O homem faz uma ideia grosseira e absurda das penas e gozos da vida futura. Falta-lhe suficiente desenvolvimento da inteligência. A criança não compreende as coisas como o adulto. Isso depende também do que se lhe ensinou e aí há necessidade de uma reforma.
A felicidade dos bons espíritos consiste em conhecerem todas as coisas; em não sentirem ódio, nem ciúme, nem inveja, nem ambição, nem qualquer das paixões que ocasionam a desgraça dos homens. O amor que os une é-lhes fonte de suprema felicidade. Não experimentam as necessidades, nem os sofrimentos, nem as angústias da vida material. São felizes pelo bem que fazem. Contudo, a felicidade dos espíritos é proporcional à elevação de cada um. Somente os puros espíritos gozam da felicidade suprema, mas nem todos os outros são infelizes. Entre os maus e os perfeitos há uma infinidade de graus em que os gozos são relativos ao estado moral.
Os sofrimentos dos espíritos inferiores são tão variados como as causas que os determinam e proporcionais ao grau de inferioridade, como os gozos o são ao de superioridade. Podem resumir-se assim: invejarem o que lhes falta para ser felizes e não o obterem; verem a felicidade e não a poderem alcançar; pesar, ciúme, raiva, desespero, motivados pelo que os impede de ser ditosos; remorsos, ansiedade moral indefinível. Desejam todos os gozos e não os podem satisfazer; eis o que os tortura.
A influência que os espíritos exercem uns sobre os outros depende das suas qualidades. Os bons exercem-na boa; os perversos procuram desviar da senda do bem os que lhe são influenciáveis. Assim, a morte não nos livra da tentação, porém, a ação dos maus espíritos é sempre menor sobre os outros espíritos do que sobre os homens, porque lhes falta o auxílio das paixões materiais.
As paixões não existem materialmente, mas existem no pensamento dos espíritos atrasados. Os maus dão pasto a esses pensamentos, conduzindo as suas vítimas aos lugares onde se lhes ofereça o espetáculo daquelas paixões e de tudo o que as possa excitar. E nisso precisamente é que lhes está o suplício, pois essas paixões já não têm objeto real. Assim, o avarento vê o ouro que lhe não é dado possuir; o devasso, orgias em que não pode tomar parte; o orgulhoso, honras que lhe causam inveja e de que não pode gozar.
Quanto aos sofrimentos maiores a que os espíritos maus se veem sujeitos, não há descrição possível da dor moral que constitui a punição de certos crimes. Mesmo o que as sofre tem dificuldade em dar delas uma ideia. Indubitavelmente, porém, a mais horrível consiste em pensarem que estão condenadas sem remissão.
Os espíritos inferiores compreendem a felicidade do justo, "e isso lhes é um suplício porque compreendem que estão dela privados por sua culpa. Daí resulta que o espírito, liberto da matéria, aspira à nova vida corporal, pois cada existência, se for bem empregada, abrevia um tanto a duração desse suplício. É então que procede à recolha das provas por meio das quais possa expiar suas faltas. Porque o espírito sofre por todo o mal que praticou, ou de que foi causa voluntária, por todo o bem que houvera podido fazer e não fez e por todo o mal que decorra de não haver feito o bem."
Os espíritos entre os quais há recíproca simpatia para o bem encontram na sua união um dos maiores gozos, uma fonte de felicidade, visto que não receiam vê-la turvada pelo egoísmo. Formam, no mundo inteiramente espiritual, famílias pela identidade de sentimentos. Na afeição pura e sincera a que se votam reciprocamente, têm um manancial de felicidade, porquanto lá não há falsos amigos, nem hipócritas.
A crença no espiritismo ajuda o homem a melhorar-se, firmando-lhe as ideias sobre certos pontos do futuro. Apressa o adiantamento dos indivíduos e das massas, porque faculta informação sobre o que seremos um dia. É um ponto de apoio, uma luz que nos guia. O espiritismo ensina o homem a suportar as provas com paciência e resignação, afasta-o dos atos que possam retardar-lhe a felicidade, mas ninguém diz que, sem ele, não possa ela ser conseguida. Só o bem assegura a sorte futura. O bem é sempre o bem, qualquer que seja o caminho que a ele conduza.

5. PENAS TEMPORAIS


Não experimenta sofrimentos materiais o espírito que expia as suas faltas em nova existência? Será então exato dizer-se que, depois da morte, só há para a alma sofrimentos morais? "É bem verdade que quando a alma está reencarnada, as tribulações da vida são um sofrimento, mas só o corpo sofre materialmente."
Falando de alguém que morreu, costumais dizer que deixou de sofrer. Nem sempre isto exprime a realidade. Como espírito, está isento de dores físicas; porém, tais sejam as faltas que tenha cometido, pode estar sujeito a dores morais mais agudas e pode vir a ser ainda mais desgraçado em nova existência. O mau rico terá que pedir esmola e se verá a braços com todas as privações oriundas da miséria; o orgulhoso, com todas as humilhações; o que abusa de sua autoridade e trata com desprezo e dureza os seus subordinados se verá forçado a obedecer a um superior mais ríspido do que o foi. Todas as penas e tribulações da vida são expiação das faltas de outra existência, quando não a consequência das da vida atual.
A reencarnação da alma num mundo menos grosseiro "é a consequência de sua depuração, porquanto, à medida que se vão depurando, os espíritos passam a encarnar em mundos cada vez mais perfeitos, até que se tenham despojado totalmente da matéria e lavado de todas as impurezas."

6. EXPIAÇÃO E ARREPENDIMENTO


O arrependimento dá-se no estado espiritual, mas também pode ocorrer no estado corporal, quando a pessoa bem compreende a diferença entre o bem e o mal. Como consequência do arrependimento no estado espiritual, o arrependido deseja uma nova encarnação para se purificar. "O espírito compreende as imperfeições que o privam de ser feliz e, por isso, aspira a uma nova existência em que possa expiar as suas faltas."
O arrependimento no estado corporal faz com que, "já na vida atual, o espírito progrida, se tiver tempo de reparar as suas faltas. Quando a consciência o exprobra e lhe mostra uma imperfeição, o homem pode sempre melhorar-se."
Há homens que só têm o instinto do mal e são inacessíveis ao arrependimento. Porém, "todo o espírito tem que progredir incessantemente. Aquele que, nesta vida, só tem o instinto do mal, terá noutra o do bem e é para isso que renasce muitas vezes, pois preciso é que todos progridam e atinjam a meta. A diferença está somente em que uns gastam mais tempo do que outros, porque assim o querem. Aquele que só tem o instinto do bem já se purificou visto que talvez tenha tido o do mal em anterior existência."
O homem perverso que não reconheceu as suas faltas durante a vida sempre as reconhece depois da morte e, então, mais sofre, porque sente em si todo o mal que praticou, ou de que foi voluntariamente a causa. Contudo, nem sempre o arrependimento é imediato. Há espíritos que se obstinam em permanecer no mau caminho, não obstante os sofrimentos por que passam. Porém, cedo ou tarde, reconhecerão errada a senda que tomaram e o arrependimento virá. Para esclarecê-los trabalham os bons espíritos. Também os encarnados poderão ajudá-los através dos trabalhos de desobsessão, da prece e do esclarecimento espiritual.
Não se deve perder de vista que o espírito não se transforma subitamente, após a morte do corpo. Se viveu vida condenável, é porque era imperfeito. Ora, a morte não o torna imediatamente perfeito. Pode, pois, persistir com os seus erros, nas suas falsas opiniões, nos seus preconceitos, até que se tenha esclarecido pelo estudo, pela reflexão e pelo sofrimento. A expiação cumpre-se durante a existência corporal, mediante as provas a que o espírito se acha submetido e, na vida espiritual, pelos sofrimentos morais, inerentes ao estado de inferioridade do espírito.
O arrependimento durante a vida concorre para a melhoria do espírito, mas isto não é suficiente para anular as suas faltas; ele tem que expiar o seu passado. Podemos já desde esta vida ir resgatando as nossas faltas, reparando-as. Porém, não creiamos que basta para isto algumas privações pueris ou a simples distribuição em esmolas do que possuímos, depois da morte, quando de nada mais precisaremos. "Deus não dá valor a um arrependimento estéril, sempre fácil, e que apenas custa o esforço de bater o peito. A perda de um dedo mínimo, quando se esteja prestando um serviço, apaga mais faltas do que o suplício da carne suportado durante anos, com objetivo exclusivamente pessoal."
Só por meio do bem se repara o mal e a reparação nenhum mérito apresenta se não atinge o homem nem no seu orgulho nem nos seus interesses materiais. De que serve, para sua justificação, que restitua, depois de morrer, os bens mal adquiridos, quando se lhe tornaram inúteis e deles tirou todo o proveito? De que lhe serve privar-se de alguns gozos fúteis, de algumas coisas supérfluas, se permanece integral o dano que causou a outrem? De que lhe serve, finalmente, humilhar-se diante de Deus, se, perante os homens, conserva o seu orgulho?.

7. DURAÇÃO DAS PENAS FUTURAS


A duração dos sofrimentos do culpado, na vida futura, não é arbitrária, pois "Deus nunca obra caprichosamente e tudo, no universo, se rege por leis, em que a sua sabedoria e a sua bondade se revelam." Assim, a duração dos sofrimentos do culpado baseia-se no tempo necessário para que se melhore. Sendo o estado de sofrimento ou de felicidade proporcional ao grau de purificação do espírito, a duração e a natureza de seus sofrimentos dependem do tempo que ele gaste em melhorar-se. À medida que progride e que os sentimentos se lhe depuram, os seus sofrimentos diminuem e mudam de natureza.
Para o espírito sofredor o tempo se afigura mais longo do que quando estava encarnado. Só para os espíritos que já chegaram a certo grau de purificação, o tempo, por assim dizer, se apaga diante do infinito.
Os sofrimentos do espírito não poderão ser eternos, pois ele não poderá ser eternamente mau e jamais se arrepender. "Deus não criou seres tendo por destino permanecerem votados perpetuamente ao mal. Apenas os criou a todos simples e ignorantes, tendo todos, no entanto, que progredir em tempo mais ou menos longo, conforme decorrer da vontade de cada um."
Mais ou menos tardia pode ser a vontade, porém, cedo ou tarde, ela aparece, por efeito da irresistível necessidade que o espírito sente de sair da inferioridade e de se tornar feliz. Eminentemente sábia e magnânima é, pois, a lei que rege a duração das penas, porquanto subordina essa duração aos esforços do espírito. Jamais o priva do seu livre-arbítrio: se deste faz ele mau uso, sofre as consequências. Desse modo, as penas jamais poderão ser eternas, coisa que o bom senso e a razão repelem, pois uma condenação perpétua, motivada por alguns momentos de erro, seria a negação da bondade de Deus.
Os antigos, na ignorância em que se achavam, consideravam o Senhor do Universo um Deus terrível, cioso e vingativo; atribuíam-lhe as paixões dos homens. Todavia, esse não é o Deus dos cristãos que considera o amor, a caridade, a misericórdia e o perdão, como virtudes principais. Poderia, pois, Deus carecer dessas qualidades, cuja posse prescreve, como dever, às suas criaturas? Não haverá contradição em lhe atribuir a bondade infinita e a vingança também infinita? Dizemos que, acima de tudo, ele é justo e que o homem não lhe compreende a justiça. Porém, a justiça não exclui a bondade e ele não seria bom se condenasse a eternas e horríveis penas a maioria das suas criaturas. Aliás, em fazer com que a duração das penas dependa dos esforços do culpado está toda a sublimidade da justiça unida à bondade. Aí é que se encontra a verdade desta sentença: "A cada um segundo as suas obras."
A ideia da eternidade das penas deve, pois, ser combatida, por ser blasfémia sobre a justiça e a bondade de Deus, germe fecundo da incredulidade, do materialismo e da indiferença que invadiram as massas, desde que as inteligências começaram a desenvolver-se.

8. PARAÍSO, INFERNO E PURGATÓRIO


As penas e gozos são inerentes ao grau de perfeição dos espíritos. Cada um tira de si mesmo o princípio da sua felicidade ou da sua desgraça. E como eles estão por toda parte, nenhum lugar circunscrito ou fechado existe especialmente destinado a uma ou outra coisa. Quanto aos encarnados, esses são mais ou menos felizes ou desgraçados conforme é mais ou menos adiantado o mundo em que habitam.
O inferno e o paraíso, assim, nada mais são do que simples alegorias. Por toda a parte há espíritos ditosos e desditosos. Entretanto, os espíritos de uma mesma ordem reúnem-se por simpatia; mas podem reunir-se onde queiram, quando são perfeitos. A localização absoluta das regiões das penas e das recompensas só na imaginação do homem existe. Provém da sua tendência a materializar e circunscrever as coisas, cuja essência infinita não lhe é possível compreender.
Por purgatório deve-se entender as dores físicas e morais: o tempo de expiação. O que o homem chama purgatório é igualmente uma alegoria, devendo-se entender como tal não um lugar determinado, porém o estado dos espíritos imperfeitos, que se acham em expiação até alcançarem a purificação completa, que os levará à categoria dos espíritos bem-aventurados. Operando-se essa purificação por meio das diversas encarnações; o purgatório consiste nas provas da vida corporal.
A palavra céu deve ser entendida no sentido de espaço universal; são os planetas, as estrelas e todos os mundos superiores, onde os espíritos usam plenamente das suas faculdades, sem as tribulações da vida material, nem as angústias peculiares à inferioridade.
De acordo com a ideia restrita que se fazia outrora dos lugares das penas e das recompensas e, sobretudo, de acordo com a opinião de que a Terra era o centro do universo, de que o firmamento formava uma abóbada e que havia uma região das estrelas, o céu era situado no alto e o inferno em baixo. Daí as expressões: subir ao céu, estar no mais alto dos céus, ser precipitado no inferno. Hoje, que a ciência demonstrou ser a Terra apenas, entre tantos milhões de outros, um dos menores mundos, sem importância especial; que provou ser infinito o espaço, não haver alto nem baixo no universo, teve-se que renunciar a situar o céu acima das nuvens e o inferno nos lugares inferiores.
Quanto ao purgatório, nenhum lugar lhe fora designado. Estava reservado ao espiritismo dar de tudo isso a explicação mais racional, mais grandiosa e, ao mesmo tempo, mais consoladora para a humanidade. Pode-se assim dizer que trazemos em nós mesmos o nosso inferno e o nosso paraíso. O purgatório, achamo-lo na encarnação, nas vidas corporais ou físicas. A última questão de "O Livro dos Espíritos", de cuja resposta extraímos apenas as partes que nos interessam de momento, é a seguinte: "Poderá, um dia, implantar-se na Terra o reinado do bem”? O bem reinará na Terra quando, entre os espíritos que a vêm habitar, os bons predominarem, porque, então, farão com que aí reinem o amor e a justiça, fonte do bem e da felicidade. Por meio do progresso moral e praticando as leis de Deus é que o homem atrairá para a Terra os bons espíritos e dela afastará os maus. Estes, porém, não a deixarão, senão quando daí estejam banidos o orgulho e o egoísmo.
Predita foi a transformação da humanidade e vos avizinhais do momento em que se dará, momento cuja chegada apressam todos os homens que auxiliam o progresso. Essa transformação se verificará por meio da encarnação de espíritos maus, que a morte vai ceifando dia a dia, e todos os que tentem deter a marcha das coisas serão daí excluídos, pois que viriam a estar deslocados entre os homens de bem, cuja felicidade perturbariam. Irão para mundos novos, menos adiantados, desempenhar missões penosas, trabalhando pelo seu próprio adiantamento, ao mesmo tempo que trabalharão pelo dos seus irmãos ainda mais atrasados. Neste dado, poderemos perceber as alegorias do paraíso perdido, quando o homem veio para a Terra em condições análogas, e do pecado original, ao trazer em si o germe das suas paixões e os vestígios da sua inferioridade. Essa figura do "pecado original" prende-se, assim, à natureza ainda imperfeita do homem, que é responsável por si mesmo, pelas suas próprias faltas e não pelas de seus pais.

A cada um segundo as suas obras, no Céu como na Terra: tal é a lei da Justiça Divina.

Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. 1a. parte, Capítulo 7. As penas futuras segundo o Espiritismo.
2. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. 1a. parte, Capítulo 3, item 18.
3. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. 1a. parte, Capítulo 4,, item 21.
4. Allan Kardec. O livro dos Espíritos. Pergunta 1014.
5. Francisco Candido Xavier. Justiça Divina. FEB, 1991, pg 65-66 e 103

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