domingo, 31 de março de 2013

7. A PÁSCOA NA VISÃO ESPÍRITA



Deixando de lado o apelo comercial da data, e o caráter de festividade familiar, a exemplo do Natal, nossa atenção e consciência requerem uma explicação plausível do significado da data e de sua representação perante o contexto filosófico-científico-moral da Doutrina Espírita.
Deve-se comemorar a Páscoa? Como o Espiritismo visualiza o acontecimento da paixão, crucificação, morte e ressurreição de Jesus? Em linhas gerais, as instituições espíritas não celebram a Páscoa, nem programam situações específicas para “marcar” a data, como fazem as demais religiões ou filosofias “cristãs”. Todavia, o sentimento de religiosidade que é particular de cada ser-Espírito, é, pela Doutrina Espírita, respeitado, de modo que qualquer manifestação pessoal ou, mesmo, coletiva, acerca da Páscoa não é proibida, nem desaconselhada.
O certo é que a figura de Jesus assume posição privilegiada no contexto espírita, dizendo-se, inclusive, que a moral de Jesus serve de base para a moral do Espiritismo. Assim, como as pessoas, via de regra, são lembradas, em nossa cultura, pelo que fizeram e reverenciadas nas datas principais de sua existência corpórea (nascimento e morte), é absolutamente comum e verdadeiro lembrarmo-nos das pessoas que nos são caras ou importantes nestas datas. Não há, francamente, nenhum mal nisso. Mas, como o Espiritismo não tem dogmas, sacramentos, rituais ou liturgias, a forma de encarar a Páscoa, assume uma conotação bastante peculiar. 


1. A PÁSCOA NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE

A Páscoa, primeiramente, não é, de maneira inicial, relacionada ao martírio e sacrifício de Jesus. Veja-se, por exemplo, no Evangelho de Lucas (cap. 22, versículos 15 e 16), a menção, do próprio Cristo, ao evento: “Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta Páscoa, antes da minha paixão. Porque vos declaro que não tornarei a comer, até que ela se cumpra no Reino de Deus.” Evidente, aí, a referência de que a Páscoa já era uma “comemoração”, na época de Jesus, uma festa cultural e, portanto, o que temos hoje é uma adaptação, um novo significado, associando-o à “imolação” de Jesus, no pós-julgamento, na execução da sentença de Pilatos.
A palavra Páscoa tem origem em dois vocábulos hebraicos: um, derivado do verbo pasah, quer dizer “passar por cima” (Êxodo, 23: 14-17), outro, traz raiz etimológica de pessach (ou pasha, do grego) que indica apenas “passagem”. Trata-se de uma festa religiosa tradicionalmente celebrada por judeus e por católicos das igrejas romana e ortodoxa, cujo significado é distinto entre esses dois grupos religiosos.
No judaísmo, a Páscoa comemora dois gloriosos eventos históricos, ambos executados sob a firme liderança de Moisés: no primeiro, os judeus são libertados da escravidão egípcia, assinalada a partir da travessia no Mar Vermelho (Êxodo 12, 13 e 14). O segundo evento caracteriza a vida em liberdade do povo judeu, a formação da nação judaica e  a sua  organização religiosa, culminada com o recebimento do Decálogo ou Os Dez Mandamentos da Lei de Deus (Êxodo 20:1-21). As festividades da  Páscoa judaica duram sete dias, sendo proibida a  ingestão de alimentos e bebidas fermentadas durante o período. Os pães asmos (hag hammassôt), fabricados sem fermento, e a carne de cordeiro são os alimentos básicos.
 
A Páscoa dos católicos, festejada pelas igrejas romana e ortodoxa, refere-se à ressurreição de Jesus, após a sua morte na cruz (Mateus, 28:1-20; Marcos 16:1-20; Lucas 24:1-53; João 20:1-31 e 21:1-25). A data da comemoração da Páscoa cristã, instituída a partir do século II da Era atual, foi motivo de muitos debates no passado. Assim, no primeiro concílio eclesiástico católico, o Concílio Nicéia, realizado em 325 d.C, foi estabelecido que a Páscoa católica não poderia coincidir com a judaica. A partir daí, a Igreja de Roma segue o calendário Juliano (instituído por Júlio César), para evitar a coincidência da Páscoa com o Pessach. Entretanto, as igrejas da Ásia Menor, permaneceram seguindo o calendário gregoriano, de forma que a comemoração da Páscoa dos católicos ortodoxos  coincide, vez ou outra, com a judaica. 

Os cristãos adeptos da igreja reformada, em especial a luterana, não seguem os ritos dos católicos romanos e ortodoxos, pois não fazem vinculações da Páscoa com a ressurreição do Cristo. Adotam a orientação mais ampla de que há, com efeito, apenas uma ceia pascoal, uma reunião familiar, instituída pelo próprio Jesus (Mateus 26:17-19; Marcos 14:12-16; Lucas 22:7-13) no dia da Páscoa judaica. Assim, entendem que não há porque celebrar a Páscoa no dia da ressurreição do Cristo.  Por outro, fundamentados em certas orientações do apóstolo Paulo (1 Coríntios 5:7), defendem a ideia de ser o Cristo, ele mesmo, a própria Páscoa, associando a este pensamento importante interpretação de outro ensinamento  de Paulo de Tarso (1 Corintios 5:8): o “cristão deve lançar fora o velho fermento, da maldade e da malícia, e colocar no lugar dele os asmos da sinceridade e da verdade.
Algumas festividades politeístas relacionados à chegada da primavera e à fertilidade passaram à posteridade e foram incorporados à simbologia da Páscoa. Por exemplo, havia (e ainda há) entre países da Europa e Ásia Menor o hábito de pintar ovos cozidos com cores diferentes e decorá-los com figuras abstratas, substituídos, hoje, por ovos de chocolate. A figura do coelho da páscoa, tão comum no Ocidente, tem origem no culto à deusa nórdica da fertilidade Gefjun, representada por uma lebre (não coelho). As sacerdotisas de Gefjun eram capazes de prever o futuro, observando as vísceras do animal sacrificado. 

      É interessante observar que nos países de língua germânica, no passado, havia uma palavra que denotava a festa do equinócio do inverno. Subsequentemente, com a chegada do cristianismo, essa mesma palavra passou a ser empregada para denotar o aniversário da ressurreição de Cristo. Essa palavra, em inglês, “Easter”, parece ser reminiscência de “Astarte”,  a deusa-mãe da fertilidade, cujo culto era generalizado  por todo o mundo antigo oriental e ocidental, e que na Bíblia é chamada de Astarote. (…) Já no grego e nas línguas neolatinas, “Páscoa” é nome que se deriva do termo grego pascha.
 
2. A VISÃO DO ESPIRITISMO
 
A Doutrina Espírita não comemora a Páscoa, ainda que acate os preceitos do Evangelho de Jesus, o guia e modelo que Deus nos concedeu: “(…) Jesus representa o tipo da perfeição moral que a Humanidade pode aspirar na Terra.” Contudo, é importante destacar: o Espiritismo respeita a Páscoa comemorada pelos judeus e cristãos, e compartilha o valor do simbolismo  representado, ainda que apresente outras interpretações.  A liberdade conquistada pelo povo judeu, ou a de qualquer outro povo no Planeta, merece ser lembrada e celebrada. Os Dez Mandamentos, o clímax da missão de Moisés, é um código ”(…) de todos os tempos e de todos os países, e tem, por isso mesmo, caráter divino. (…).” A ressurreição do Cristo representa a vitória sobre a morte do corpo físico, e anuncia, sem sombra de dúvidas, a imortalidade e a sobrevivência do Espírito em outra dimensão da vida.
           Os discípulos do Senhor conheciam a importância da certeza na sobrevivência para o triunfo da vida moral. Eles mesmos se viram radicalmente transformados, após a ressurreição do Amigo Celeste, ao reconhecerem que o amor e a justiça regem o ser além do túmulo. Por isso mesmo, atraiam companheiros novos, transmitindo-lhes a convicção de que o Mestre prosseguia vivo e operoso, para lá do sepulcro.
Os espíritas procuram comemorar a Páscoa todos os dias da existência, a se traduzir no esforço perene de vivenciar a  mensagem de Jesus, estando cientes que, um dia, poderemos também testemunhar esta certeza do inesquecível apóstolo dos gentios: Fui crucificado junto com Cristo. Já não sou eu quem vivo, mas é Cristo vive em mim.  Minha vida presente na carne, vivo-a no corpo, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim”. (Gálatas 2.20)
    No que concerne à ressurreição, podemos dizer que a interpretação tradicional aponta para a possibilidade da mantença da estrutura corporal do Cristo, no post-mortem, situação totalmente rechaçada pela ciência, em virtude do apodrecimento e deterioração do envoltório físico. As Igrejas cristãs insistem na hipótese do Cristo ter “subido aos Céus” em corpo e alma, e fará o mesmo em relação a todos os “eleitos” no chamado “juízo final”. Isto é, pessoas que morreram, pelos séculos afora, cujos corpos já foram decompostos e reaproveitados pela terra, ressurgirão, perfeitos, reconstituindo as estruturas orgânicas, do dia do julgamento, onde o Cristo separará justos e ímpios.
Mas, como explicar então as “aparições” de Jesus, nos quarenta dias póstumos, mencionadas pelos religiosos na alusão à Páscoa? A fenomenologia espírita (mediúnica) aponta para as manifestações psíquicas descritas como mediunidades. Em algumas ocasiões, como a conversa com Maria de Magdala, que havia ido até o sepulcro para depositar algumas flores e orar, perguntando a Jesus – como se fosse o jardineiro – após ver a lápide removida, “para onde levaram o corpo do Raboni”, podemos estar diante da “materialização”, isto é, a utilização de fluido ectoplásmico – de seres encarnados – para possibilitar que o Espírito seja visto (por todos). Igual circunstância se dá, também, no colóquio de Tomé com os demais discípulos, que já haviam “visto” Jesus, de que ele só acreditaria, se “colocasse as mãos nas chagas do Cristo”. E isto, em verdade, pelos relatos bíblicos, acontece. Noutras situações, estamos diante de uma outra manifestação psíquica conhecida, a mediunidade de vidência, quando, pelo uso de faculdades mediúnicas, alguém pode ver os Espíritos.

A Páscoa, em verdade, pela interpretação das religiões e seitas tradicionais, acha-se envolta num preocupante e negativo contexto de culpa. Afinal, acredita-se que Jesus teria padecido em razão dos “nossos” pecados, numa alusão descabida de que todo o sofrimento de Jesus teria sido realizado para “nos salvar”, dos nossos próprios erros, ou dos erros cometidos por nossos ancestrais, em especial, os “bíblicos” Adão e Eva, no Paraíso. A presença do “cordeiro imolado”, que cumpre as profecias do Antigo Testamento, quanto à perseguição e violência contra o “filho de Deus”, está flagrantemente aposta em todas as igrejas, nos crucifixos e nos quadros que relatam – em cores vivas – as fases da via sacra.
        O Evangelista João nos diz que Cristo é a nossa Páscoa (libertação), pois Ele é o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo(João 1:29). João usou o termo Cordeiro, porque usava-se na época de Moisés, sacrificar um cordeiro para agradar á Deus. Portanto, dá-se a ideia de que, Deus sacrificou Jesus para nos libertar dos pecados. Mas para nos libertarmos dos “pecados”, ou seja, dos nossos erros, das nossas falhas morais, devemos estar dispostos a contribuir, utilizando os ensinamentos do Cristo como nosso guia. Porque Jesus não morreu para nos salvar; Jesus viveu para nos mostrar o caminho da salvação. Esta palavra “salvação”, segundo Emmanuel, vale por “reparação”, “restauração”, “refazimento”. Portanto, “salvação” não é ganhar o reino dos céus; não é o encontro com o paraíso após a morte; salvação é "libertação" de compromisso; é regularização de débitos. Como diz a bandeira do Espiritismo: "Fora da Caridade não há Salvação". Então, fora da prática do amor (caridade) de uns pelos outros, não estaremos salvos, livres das complicações criados por nós mesmos, através de brigas, violência, exploração, desequilíbrios, frustrações e muitos outros problemas que fazem a nossa infelicidade.
Esta tradição judaico-cristã da “culpa” é a grande diferença entre a Páscoa tradicional e a visão espírita. Em verdade, nós espíritas devemos reconhecer a data da Páscoa como a grande – e última – lição de Jesus, que vence as iniquidades, que retorna triunfante, que prossegue sua cátedra pedagógica, para asseverar que “permaneceria eternamente conosco”, na direção bussolar de nossos passos, doravante.

3. CONCLUSÃO

Nestes dias de festas materiais ou lembranças do sofrimento do Rabi, possamos encarar a Páscoa como o momento de transformação, a vera evocação de liberdade, pois, uma vez despojado do envoltório corporal, pôde Jesus retornar ao Plano Espiritual para, de lá, continuar “coordenando” o processo depurativo de nosso orbe.
Longe da remissão da celebração de uma festa pastoral ou agrícola, ou da libertação de um povo oprimido, ou da ressurreição de Jesus, possa ela ser encarada por nós como a vitória real da vida sobre a morte, pela certeza da imortalidade e da reencarnação, porque a vida, em essência, só pode ser conceituada como o amor, calcado nos grandes exemplos da própria existência de Jesus, de amor ao próximo e de valorização da própria vida.
Nesta Páscoa, assim, quando estiveres junto aos teus mais caros, lembra-te de reverenciar os belos exemplos de Jesus, que O imortalizam e que nos guiam para, um dia, também estarmos na condição experimentada por Ele, qual seja a de “sermos deuses”, “fazendo brilhar a nossa luz”. Comemore, então, meu amigo, uma “outra” Páscoa, a da sua transformação, rumo a uma vida plena.
  
REFERÊNCIAS
- Apostila de Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita. FEB.
- BÍBLIA DE JERUSALÉM. Diversos tradutores. São Paulo: Paulus, 2002.
- ELWELL, Walter A (editor). Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã. Trad. Gordon Chow. 1ªed. 3ª reimp. Vol. III.  São Paulo: Edições Vida Nova, 2003.
- DOUGLAS, J.D. (organizador). O Novo Dicionário da Bíblia. Tradução de  João Bentes. 3ª ed. rev. São Paulo: Vida Nova, 2006.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos (Questão 625). Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2ªed. 1ª reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2011.
_____. O Evangelho segundo o Espiritismo (Cap. I ítem2). Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1ªed. 1ª reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2008.
- J.D. Douglas. O Novo Dicionário da Bíblia.
- XAVIER, Francisco Cândido. Pão Nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 1ªed. 3ª reimp. Brasília: FEB Editora, 2012.
 

 

domingo, 24 de março de 2013

6. EXISTÊNCIA E SOBREVIVÊNCIA DO ESPÍRITO




1. DEFINIÇÃO
        Encontramos em O Livro dos Espíritos (1.857), na Parte Segunda, que trata do Mundo Espírita ou Mundo dos Espíritos, no Capítulo Primeiro – Dos Espíritos, subtítulo Origem e Natureza dos Espíritos, a questão n.º 76, que nos traz uma definição a respeito dos Espíritos:

Que definição se pode dar dos Espíritos?
Resposta: Pode dizer-se que os Espíritos são os seres inteligentes da criação. Povoam o Universo, fora do mundo material.”

2. CRIAÇÃO POR DEUS
        Os Espíritos são seres distintos da Divindade, são sua obra, precisamente como a máquina o é do homem que o fabrica. A máquina é obra do homem, não é o próprio homem.  O mesmo se dá com relação a Deus: somos seus filhos, pois que somos obra sua. (referência – questão 77 de O Livro dos Espíritos).

3. PRINCÍPIO DOS ESPÍRITOS
        Os Espíritos tiveram princípio, pois são criações de Deus; submetidos à sua vontade. Deus existe de toda eternidade, isso é incontestável; mas quando e como ele criou, não o sabemos.
        Os Espíritos são individualizações do princípio inteligente, como os corpos são individualizações do princípio material; a época e a maneira dessa formação é que desconhecemos.

4. ATRIBUTO DO ESPÍRITO - INCORPORIEDADE
        Na questão 82 de O Livro dos Espíritos, é indagado se eles são Imateriais, e a resposta é no seguinte sentido:
        "Como se pode definir uma coisa, quando faltam termos de comparação e com uma linguagem deficiente? Pode um cego de nascença definir a luz? Imaterial não é bem o termo; incorpóreo seria mais exato, pois deves compreender que, sendo uma criação, o Espírito há de ser alguma coisa. É a matéria quintessenciada, mas sem analogia para vós outros, e tão etérea que escapa inteiramente ao alcance dos vossos sentidos."

Complementa Kardec:
“Dizemos que os Espíritos são imateriais, porque, pela sua essência, diferem de tudo o que conhecemos sob o nome de matéria. Um povo de cegos careceria de termos para exprimir a luz e seus efeitos. O cego de nascença se julga capaz de todas as percepções pelo ouvido, pelo olfato, pelo paladar e pelo tato. Não compreende as idéias que só lhe poderiam ser dadas pelo sentido que lhe falta. Nós outros somos verdadeiros cegos com relação à essência dos seres sobre-humanos. Não os podemos definir senão pôr meio de comparações sempre imperfeitas, ou pôr um esforço da imaginação.

5. DA NATUREZA DOS ESPÍRITOS
        A natureza dos Espírito não é a mesma da matéria. A posição da doutrina Espírita é bem definida quanto à origem do espírito e da matéria. No capítulo XI, número 6 de A Gênese (Quinto livro da Codificação – 1.868), é desenvolvido o seguinte raciocínio:  "O Princípio Espiritual teria sua fonte no Elemento Cósmico Universal? não seria apenas uma transformação, um modo de existência deste elemento, como a luz, a eletricidade, o calor, etc.?
Resposta - Se assim fosse, o Princípio Espiritual passaria pelas vicissitudes da matéria; extinguir-se-ia pela desagregação como o princípio vital; o ser inteligente só teria uma existência momentânea como o corpo e com a morte voltaria para o nada, ou - o que viria a dar no mesmo - para o todo universal. seria, numa palavra, a sanção das doutrinas materialistas".
        Sobre o que não paira menor dúvida é a união do Princípio Espiritual à matéria, e, em estágio mais avançados, já o Espírito individualizado, que se serve da matéria como elemento indispensável ao seu progresso... e, como bem nos ensina a resposta da questão 540, de O Livro dos Espíritos: "é assim que tudo serve, que tudo se encadeia na Natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo, que também começou pôr ser átomo. Admirável lei de harmonia,  que o vosso acanhado espírito ainda não pode apreender em seu conjunto”.

6. MUNDO NORMAL PRIMITIVO
        Encontramos em O Livro dos Espíritos, ainda na Parte Segunda, Capítulo Primeiro, nas questões 84 à 87, esclarecimentos relacionados com o Mundo Normal Primitivo.

84. Os Espíritos constituem um mundo à parte, fora daquele que vemos?
"Sim, o mundo dos Espíritos, ou das inteligências incorpóreas."
       
85. Qual dos dois, o mundo espírita ou o mundo corpóreo, é o principal, na ordem das coisas?
"O mundo espírita, que preexiste e sobrevive a tudo."
       
86. O mundo corporal poderia deixar de existir, ou nunca ter existido, sem que isso alterasse a essência do mundo espírita?
"Decerto. Eles são independentes; contudo, é incessante a correlação entre ambos, porquanto um sobre o outro incessantemente reagem."
       
87. Ocupam os Espíritos uma região determinada e circunscrita no espaço?
"Estão pôr toda parte. Povoam infinitamente os espaços infinitos. Tendes muitos deles de contínuo a vosso lado, observando-vos e sobre vós atuando, sem o perceberdes, pois que os Espíritos são uma das potências da Natureza e os instrumentos de que Deus se serve para execução de Seus desígnios providenciais. Nem todos, porém, vão a toda parte, pôr isso que há regiões interditas aos menos adiantados."

7. A ALMA HUMANA
        Foram inúmeras as concepções sobre a Alma Humana no decorrer do tempo. A divergência de opiniões decorre da aplicação particular que cada um dá a esse termo.
·   Concepção Materialista: A Alma é concebida como (com) o princípio da vida material orgânica. Seria efeito e não causa. Do funcionamento do corpo resultaria a alma como efeito.
·    Concepção Panteísta: A Alma Universal seria Deus, a distribuir centelhas pêlos diversos seres, voltando estes, após a morte, a se confundirem com o todo.
·  Concepção Espiritualista: A Alma é eterna, independente do corpo e sede dos fenômenos psicológicos. É interpretada como não sendo preexistente, limitando o ser a única existência com destino irrevogável.
· Concepção Espírita: Após a demonstração de um Mundo Espiritual Primitivo através das manifestações dos Espíritos revelando o que são, sua natureza e destino, o Espiritismo nos trouxe uma definição da alma com extrema clareza.

Na Parte Segunda, Capítulo Segundo – Da Encarnação dos Espíritos, subtítulo A Alma, de O Livro dos Espíritos, encontramos a seguinte indagação na questão 134:

Que é a alma?
"Um Espírito encarnado."
a) - Que era a alma antes de se unir ao corpo?
"Espírito."
b) - As almas e os Espíritos são, portanto, idênticos, a mesma coisa?
"Sim, as almas não são senão os Espíritos. Antes de se unir ao corpo, a alma é um dos seres inteligentes que povoam o mundo invisível, os quais temporariamente revestem um invólucro carnal para se purificarem e esclarecerem."
Alma é um ser real, individual, independente, autônomo e que sobrevive ao corpo. tem ela pôr objeto o crescer em conhecimento e virtudes até tornar-se espírito puro e não mais necessitar de reencarnação.

8. A SOBREVIVÊNCIA DA ALMA ATRAVÉS DOS TEMPOS
        As crenças na imortalidade da alma foram generalizadas entre os povos da antiguidade. 
        A universalidade dessa crença pode ser explicada pela intuição que os Espíritos trazem ao reencarnar, sobre sua preexistência.
        Durante a vida corpórea são comuns experiências de comunicação com parentes desencarnados, seja durante a vigília ou durante o desprendimento natural (emancipação da alma) pelo sono, ou ainda através da observação continuada de que, apesar da decomposição dos despojos, o mesmo ser reaparece e demostra que continua a viver.
        A partir da intuição e vivências reafirma-se a crença em uma outra existência após a morte do corpo físico.
        A concepção da alma, não teve a sua origem com a Doutrina Espírita, muito pelo contrário, já era conhecida desde a mais remota antiguidade. Vejamos alguns exemplos:
- VEDAS: De acordo com os Vedas, que em sânscrito quer dizer: “Visão, Conhecimento” – e que significa o nome genérico dado a toda literatura da época, formando a base das religiões hindus (datam de aproximadamente cinco mil anos antes de Cristo), já era ensinado que a alma é imortal e reencarna sucessivamente até atingir a perfeição.
        Essas obras constituem a “Bíblia da Índia” e nela encontram-se preciosos ensinos espiritualistas, como a comunicabilidade dos Espíritos, a reencarnação, a pluralidade dos mundos, além de sábios conselhos, muitos deles semelhantes aos que nos foram legados pelo Cristo.
- KRISHNA: Foi o grande inspirador das crenças dos hindus. Através de sua doutrina, verificamos que a imortalidade da alma, as vidas sucessivas, a lei de causa e efeito, além de elevada moral baseada no amor, faziam parte de seus ensinos.
        “O corpo – dizia ele – envoltório da alma que aí faz sua morada, é uma coisa finita; porém a alma que o habita é imortal, imponderável e eterna”.
        “Como a gente tira do corpo as roupas usadas e as substitui pôr outras novas e melhores, assim, também, o habitante do corpo, tendo abandonado a velha morada mortal, entra em outra nova e recém preparada para ele.
        Esses ensinos nos mostram a imortalidade da alma e a reencarnação, como princípios básicos, e que a vida do corpo é transitória.
- BUDA: Há 560 anos antes de cristo, nascia Siddarta Gautama, da família dos Sakyas e de Maya filho de reis. Renunciou às grandezas, à vida faustosa para isolar-se nas florestas, às margens dos grandes rios asiáticos, em profunda meditação e estudo, durante sete anos, reaparecendo, depois, para pregar a necessidade de se praticar o bem, porque “o bem – dizia ele – é o fim supremo da natureza”.
        Após a iluminação recebe o título de Buddha. Ele, como krishna, se fundamenta nos Vedas, adequando ao momento, suas doutrinas sobre a imortalidade da alma e renascimentos. Exemplo de um de seus ensinamentos que demonstra ensinamentos sobre a imortalidade da alma, a reencarnação e a lei de causa e efeito.
“O que é que julgais, ó discípulo, seja maior: a água do vasto oceano, ou as lágrimas que vertestes, quando, na longa jornada, erraste ao acaso, de renascimento em renascimento, unidos àquilo que odiastes, separados daquilo que amastes? Uma vida curta, uma vida longa, um estado mórbido, uma boa saúde, o poder, a fraqueza, a fortuna, a pobreza, a ciência, a ignorância... tudo isso depende de atos cometidos em anteriores existências.”
- EGÍPCIOS: Entre os egípcios, a crença na imortalidade da alma era tão forte que os levaram a desenvolver a Geometria e Arquitetura, construindo suas famosas pirâmides e estátuas.
        Entre os livros de Hermes Trimegisto, encontramos O Livro dos Mortos, onde estão representadas as viagens da alma após a morte.
- CHINESES: Desde épocas remotas existia entre os chineses o Culto dos Espíritos e prestavam honras ao Espírito dos antepassados. Os pensadores que se destacaram foram: Lao Tsé e Confúcio.
        Confúcio encontrou no Templo da Luz a seguinte inscrição:  "Falando ou agindo, não penses, embora te aches só que não és visto e nem ouvido, os Espíritos são testemunhas de tudo".
- GREGOS: Os Gregos herdaram as tradições do Oriente, iniciando a Europa na sabedoria material e espiritual, há 2.500 anos aproximadamente.
        Pitágoras (570-496 a.C.) foi o forjador da Civilização Ocidental e conhecia os mistérios iniciáticos do Egito, Pérsia e Índia. Os Gregos acreditavam na individualidade após a morte e no princípio espiritual preexistente ao nascimento e sobrevivente à morte.
        Sócrates e Platão continuaram a obra de Pitágoras em suas doutrinas. Segundo Allan Kardec, encontramos nessas doutrinas os princípios fundamentais do Espiritismo. Foram os precursores das ideias cristãs e, consequentemente, do Espiritismo.
        Os Gauleses tinham tão grande certeza na vida futura que se encaminhavam para a morte como para uma festa, e consideravam covardia usar de astúcia na guerra.
        Os Essênios, grupo de iniciados do Vale do Nilo, ensinavam a pequeno número de adeptos leis superiores do Universo como a imortalidade da alma e preexistência.
        No Antigo e Novo Testamento encontramos inúmeras referências à imortalidade, comunicação e reencarnação dos Espíritos, os profetas são inspirados e orientados por seres espirituais.
Jesus ensinou, em muitas passagens do Evangelho, sobre a imortalidade e reenarnação. Os primeiros cristãos comunicavam-se com os Espíritos, existindo referência nos "Atos dos Apóstolos" (escrito por Lucas).
Quanto às comunicações espirituais, houveram grandes perseguições durante a Idade Média. Médiuns eram queimados como feiticeiros. Nos tempos modernos tivemos mais liberdade de pensamento e expressão.
        Graças às experiências espíritas, foram obtidas provas da imortalidade da alma e fotografaram radiações do pensamento e o Espírito revestido de seu invólucro semi-material (Perispírito).

9. PROVAS DA EXISTÊNCIA E SOBREVIVÊNCIA DOS ESPÍRITOS
        Ser uma pessoa é ter uma consciência, um "eu" que reflete, examina-se, recorda-se. O pensamento e a consciência, não derivam de um universo químico e mecânico. O primeiro problema que se apresenta é o do próprio pensamento, do ser pensante.
        Descartes escreveu "penso, logo existo" (cogito,ergos sum, em tradução rigorosamente literal). Entretanto, o que devia estar no raciocínio do grande filósofo não pode deixar de ser o seguinte: - penso; ora, a matéria pôr si mesma não pensa; logo, existe em mim, além do corpo material, algo mais, que é o agente do meu pensamento; em virtude do qual, portanto, existo como ser inteligente e tenho plena consciência da minha existência. É um raciocínio perfeitamente lógico e conforme à mais pura razão humana. Deveria bastar para que nenhuma dúvida existisse no homem a respeito de que nele vive essencialmente um Espírito, isto é, um ser imaterial, porém, real, independente do corpo e a ele sobrevivente, e somente ao qual são inerentes as faculdades superiores da inteligência e da razão.
        "Seja qual for a idéia que dos Espíritos se faça, a crença neles necessariamente se funda na existência de um princípio inteligente fora da matéria. Deus, em sua infinita bondade e amor, como Divina Providência, concedeu ao homem, com as manifestações espíritas, as provas cabais de que nele vive um Espírito, e que esse Espírito sobrevive à morte.
        "As experiências de cunho científico, realizadas a partir da oficialização da Doutrina Espírita em 18 de abril de 1857, pôr inúmeros sábios daquela época, removeram todas as controvérsias existentes sobre a sobrevivência da alma humana depois da morte biológica.
        Dentre os inúmeros pesquisadores que se inteiraram na busca de provas da existência e imortalidade dos espíritos, destacamos:  "(...) o Dr. Paul Gibier, diretor do instituto Pasteur de Nova Iorque, fala das materializações de fantasmas obtidas pôr ele no seu próprio laboratório, na presença de muitas senhoras da sua família e dos preparadores que habitualmente o auxiliavam nos seus trabalhos de biologia.(...)"

- Aksakof fotografou os espíritos Abdullah e John King;
 - "(...) o acadêmico R.Wallace e o Dr. Thompson obtiveram a fotografia espírita de suas respectivas mães, falecidas havia muitos anos.(...)"
- na obra  La Personnalité Humaine, Myers fala de 231 casos de aparições de pessoas mortas.(...)"
 - Friedrich Zollner, sábio físico e astrônomo alemão realizou experiências com o médium Henri Slade, conseguindo inclusive o extraordinário fenômeno de desmaterialização da matéria, tornando possível a penetração de corpos materiais pôr outros e a escrita direta sobre uma lousa, sem intermediário material algum.
 - Oliver Lodge, sábio inglês descreve experiências com diversos médiuns, através dos quais pode, com toda a evidência, constatar a manifestação de seu filho Raymond Lodge, jovem engenheiro, morto em 1915, aos 26 anos, numa trincheira, em Flandres, Bélgica, durante a Guerra de 1914 - 1918, tendo fornecido claros sinais de identificação de sua personalidade individual.
        "Resolvido a fazer uma investigação criterioso dentro dos princípios rígidos da própria ciência para desmascarar como fraudulentos, conscientes ou inconscientes, os chamados fenômenos espíritas, o sábio inglês William Crookes, considerado o Pai da Física moderna, deparou-se com a evidência dos fatos e humildemente declarou aos seus pares  da Sociedade Psíquica de Londres: “Não digo que isto pode ser possível, afirmo que é real". Reportava-se naquele momento aos fenômenos acontecidos na sua própria residência, transformada num sofisticado laboratório de pesquisas psíquicas, onde submeteu vários médiuns aos exaustivos testes da paranormalidade, debaixo de severo controle instrumental e fiscalizados pela observação criteriosa de seu profundo senso científico.
        Durante três anos consecutivos, o descobridor da energia radiante, um novo estado da matéria, desconhecido até à época das suas experiências transcendentais, conseguiu verdadeiros milagres utilizando-se da mediunidade exuberante de Florence Cook, médium de efeitos físicos possibilitou as materializações do espírito de Katie King, ensejando ao cientista: medir e comparar as pulsações de ambas. cujos valores eram diferentes; conversar e abraçar a entidade espiritual materializada, assim como retirar amostra dos cabelos e do vestuário para exames posteriores, afastando a idéia alucinatória; e finalmente, fotografar várias vezes, inclusive à luz do dia a forma perispiritual humanizada com êxito incomparável.
 - Prof. Richet que se viu "(...)obrigado a escrever, cinquenta(50) anos depois de William Crookes: “Os espíritas me têm censurado duramente pôr empregar essa palavra – “absurdo” - e não puderam compreender, que eu não me resignasse a aceitar, sem constrangimento, a realidade de tais fenômenos. Mas, para conseguir que um fisiologista, um físico, um químico admitam que saia do corpo humano uma forma que possui circulação, calor próprio e músculos, que exala ácido corbônico, que pesa, que fala, que pensa, é preciso pedir-lhe um esforço intelectual, verdadeiramente muito doloroso.


10. CONCLUSÃO
Quanto a existência do Espírito, já é muito que seja uma teoria que nem a razão, nem a ciência repelem.  Acresce que, se os fatos a corroboram, tem ela por si a sanção do raciocínio e da experiência.  Esses fatos se nos deparam no fenômeno das manifestações espíritas, que, assim, constituem a prova patente da existência e da sobrevivência da alma.  Muitas pessoas há, entretanto, cuja crença não vai além desse ponto; que admitem a existência das almas e, conseguintemente, a dos Espíritos, mas que negam a possibilidade de nos comunicarmos com eles, pela razão, dizem, de que seres imateriais não podem atuar sobre a matéria.
Infelizmente o grande público não sabe absolutamente nada sobre as inúmeras experiências científicas que provam a sobrevivência da alma, como essas que acabamos de narrar. Por isso fica fácil para alguns usar de certo prestígio que sua função de religioso traz, para pregar que tudo não passa de produto do inconsciente.
        Devemos pelo menos ter lido algo a respeito dos fenômenos espirituais para depois formularmos a nossa posição, não simplesmente refutá-los sem nenhum conhecimento ou sem ter empregado qualquer método investigativo.
        O cientista Crooks já dizia que “... é dever do investigador abster-se de todo o sistema de teorias, até que ele tenha reunido um número de fatos suficientes para formar uma base sólida sobre a qual ele possa raciocinar... É preciso banir completamente as ideias românticas e as supersticiosas; os passos do investigador devem ser guiados por uma razão tão fria e desapaixonada quanto os instrumentos dos quais ele se vale para o seu trabalho”.
        Recordando os ensinos do Apóstolo da Caridade, Chico Xavier, aprendemos que:

A Natureza é minha Mãe.
O Universo é meu Caminho.
A Eternidade é meu Reino.
A Imortalidade é minha Vida.
A Mente é meu Lar.
O Coração é meu Templo.
A Verdade é meu Culto.
O Amor é minha Lei.
A Forma em sí é minha Manifestação.
A Consciência é meu Guia.
A Paz é meu Abrigo.
A Experiência é minha Escola.
O Obstáculo é minha Lição.
A Dificuldade é meu Estímulo.
A Alegria é meu Cântico.
A Dor é meu Aviso.
A Luz é minha Realização.
O Trabalho a minha Benção.
O Amigo é meu Companheiro.
O Adversário é meu Instrutor.
O Próximo é meu Irmão.
A Luta é minha Oportunidade.
O Passado a minha Advertência.
O Presente a minha Realidade.
O Futuro a minha Promessa.
O Equilíbrio é minha Atitude.
A Ordem é minha Senha.
A Beleza é meu Ideal.
A Perfeição é o meu Destino.
O ESPÍRITO